Rota do Mediterrâneo mais mortífera em 2016

Mar da morte <br>às portas da Europa

Pelo terceiro ano consecutivo, a rota migratória do Mediterrâneo foi aquela em que morreram mais imigrantes e refugiados, denunciou a Organização Internacional das Migrações (OIM).

A política implementada pela UE não está a ajudar a resolver a catástrofe

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No ano de 2016, 5079 pessoas que fugiram de regiões assolados por guerras de saque e pela miséria em direcção à Europa, acabaram por encontrar no Mar Mediterrâneo o seu sepulcro, calcula a OIM. Em comparação com 2015, foram mais 1302 as vítimas mortais, estima a organização, que sublinha que estes registos pecam por defeito, uma vez que, admite, nem todos os incidentes são conhecidos das autoridades, e naqueles que o são é difícil apurar com exactidão o número de vítimas.

A segunda rota migratória mais letal à escala global foi a do Norte de África, com 1124 mortos no ano passado, seguida da fronteira entre o México e os EUA, com 432 vítimas mortais contabilizadas.

Contas feitas, no total de imigrantes e refugidos que em 2016 morreram em trânsito movidos pela ilusão de uma vida melhor – 7495 migrante em todo o mundo, afirma ainda a OIM, quase 68 por cento ocorreram na faixa marítima que separa a África da Europa.

Os dados da OIM, citados pela Lusa, adiantam igualmente que 363.348 pessoas conseguiram atravessar o Mediterrâneo em 2016, das quais 181.436 chegaram a Itália, na sua maioria provenientes da Líbia e Egito, e 173.561 alcançaram as costas gregas provenientes da Turquia e de outras origens.

Simultaneamente, a agência encarregada da vigilância das fronteiras exteriores da UE, a Frontex, avançou, em comunicada datado de dia 6, que o número de cerca de 364 mil pessoas que conseguiu chegar à Europa por mar, representa um terço do total de migrantes e exilados que o fizeram durante o ano de 2015. Na rota dos Balcãs, a Frontex afirma que a diminuição é ainda mais significativa: 123 mil pessoas em 2016 contra cerca de 764 mil em 2015.

A Frontex atribui a diminuição dos fluxos à entrada em vigor do acordo com a Turquia, o qual prevê a expulsão para aquele país dos migrantes que cheguem à Grécia (a maioria pelo Mar Egeu). Com um local para enviar os «indesejados» por uma UE que se diz dos povos, da coesão e da solidariedade, as operações de detenção no espaço europeu parecem ter sido francamente impulsionadas. Pelo menos é o que sugerem as estatísticas da Frontex, segundo as quais mais de 503 mil imigrantes e requerentes de asilo foram detidos no ano passado. Apesar disso, a UE e operacionais de topo da Frontex lamentaram uma vez mais por estes dias que o número de pessoas enviadas para a Turquia não seja ainda maior.

Calamidade humana

Os números da OIM e da Frontex confirmam que a política restritiva implementada pela UE não está a ajudar a resolver uma catástrofe de proporções bíblicas. Antes pelo contrário. O aumento da mortalidade no Mar Mediterrâneo confirma que com o fecho ou a redução drástica das passagens nas rotas menos perigosas, está-se a conduzir os imigrantes e potenciais requerentes de asilo para travessias muito mais arriscadas e a forçá-los, pela ausência de alternativas, a aceitarem condições de travessia ainda mais ásperas, consideram organizações humanitárias citadas por agências internacionais.

O caso recente de um jovem gabonês de 19 anos resgatado de dentro de uma mala de viagem transportada por uma mulher marroquina na fronteira da cidade de Ceuta, ou os mais de mil imigrantes que na mesma cidade permaneceram horas pendurados numa rede e entraram em confrontos com os guardas no dia 1 de Janeiro, permitem aferir os riscos a que se estão a sujeitar pessoas impulsionadas pelo desespero.

A rede de tráfico de seres humanos desmantelada pelas autoridades espanholas já no início deste ano, e, sobretudo, o facto de se suspeitar que as mulheres, na sua maioria nigerianas, podiam não ignorar completamente que o seu destino na Europa seria a prostituição (donde alegadamente seriam libertadas depois de pagarem os cerca de 40 mil euros devidos pela travessia), evidenciam igualmente o nível de desespero daqueles que deixam tudo para trás em direcção ao submundo, ao degredo, à indigência, à prisão.

Por outro lado, as condições em que centenas de milhares de seres humanos permanecem em campos de acolhimento mostram uma outra dimensão a todos os títulos desumana da política da «Europa fortaleza». Aquando da divulgação dos números supra citados, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, por exemplo, alertou para problemas como a sobrelotação em centros na Grécia.

A vaga de frio polar vinda da Escandinávia que nesta época já matou mais de 30 pessoas na Europa, na sua maioria sem-abrigo e refugiados, está também a obrigar autoridades e ONG a advertirem para a possibilidade de uma mortandade sem precedentes entre migrantes que deambulam nas cidades europeias ou que se encontram retidos nas fronteiras e campos de concentração.




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